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quinta-feira, 7 de agosto de 2008

A Insensibilidade do Estado

Li este relato publicado no Blog Melobaby e não pude deixar de o partilhar convosco!!

Sou mãe de um menino de 12 anos Portador de TRISSOMIA 21, mais conhecido pela maioria das pessoas como "Mongolismo".

O meu filho, o Gonçalo, é uma criança adorável, meiga com muito amor para dar e que não escolheu nascer, nem tão pouco escolheu nascer assim, mas está cá e é um cidadão Português como todos nós!
E eu como mãe preocupo-me em dar-lhe uma vida o mais normal possível, e dar-lhe toda a felicidade que acho ele merece ter.Ao longo destes 12 anos tenho-me deparado com os mais variados problemas, e travado com as mais diversas lutas e às vezes me vão deixando sem forças para ir em frente.
E isto porque se fazem telenovelas onde se apresenta este problema da TRISSOMIA 21, se vê em revistas e na televisão falar sobre o assunto de uma forma muito soft, e toda a gente tem muita "pena" e até consegue achar piada e segue tudo com muita atenção, mas na vida real ninguém se preocupa com o problema destas crianças, ninguém apoia estas crianças.A "pena" e o "dó" estas crianças não precisam .. elas são as crianças mais felizes do mundo porque não se apercebem da crueldade que existe a volta delas.
O meu filho O GONÇALO, é uma destas crianças.Uma criança que até aos 6 anos de idade frequentou dentro das minhas possibilidades de tempo e dinheiro (sim porque tudo nesta vida é pago e bem pago qualquer participação do estado), a APPT21( Associação Portuguesa de Portadores de Trisssomia 21), no inicio em CHELAS e posteriormente em BIRRE/ CASCAIS, onde tinha todas as consultas de terapia da fala, terapia ocupacional e motora.
Após as 6 anos e dado a uma doença grave da minha mãe, que me tomou muito tempo e a varias dificuldades financeiras que passei, porque o Gonçalo, teve um pai que nunca aceitou a deficiência dele e o abandonou a ele e a mim à sua nascença, foi colocado através da APPACDM numa Escola Oficial, Integrado num Projecto de Integração para Crianças Deficientes, afim de frequentar o ensino Primário, embora eu como mãe tivesse a plena consciência de que isso seria praticamente impossível, dadas as dificuldades a nível fonético e de linguagem que o Gonçalo tem adicionados a problemas de alguma hiperactividade.
No entanto o Gonçalo frequentou durante 4 anos a Escola Primária da Azeda, pertencente ao Agrupamento Vertical de Escolas Cetóbriga, sito na Rua do Mirante em Setúbal.E por mais incrível que pareça passou todos os anos e isto porquê? - Porque segundo as normas do ensino estabelecidas pelo nossa Ministério da Educação, qualquer criança, independentemente das suas dificuldades/ deficiências e do que conseguiu ou não assimilar durante o ano lectivo em que se encontra, passa de ano, até chegar ao Ciclo, ou ao 2º ciclo como lhe chamam hoje em dia.
O que acontece é que passados 4 anos, o Gonçalo está como se estivesse entrado hoje para a 1ª classe, dado que estes projectos de integração, que o estado arranja, para tapar a boca a muita gente que como eu luta pelo direitos de um filho deficiente e porque é bonito de se ver, na realidade não funcionam, e não funcionam porquê?- Porque as crianças não tem dentro das escolas oficiais professores de apoio educativo especializados que os possam apoiar durante o período das aulas, tal como o dito ministério diz ter. E uma vez que como são crianças com vários tipos de deficiências, não aprendem como as crianças ditas normais, nem tem os mesmos métodos de ensino, porque é impossível que assim seja.
E o que acontece é exactamente o que aconteceu com o meu filho, andou durante 4 anos, praticamente por conta própria numa escola do estado, onde o pouco que aprendeu fui eu e a avó que em casa nos períodos possíveis lhe ensinamos. E digo pouco porque o Gonçalo hoje com 12 anos e numa 4ª classe, sabe escrever o nome dele e mal, sabe contar até 10 e sabe o abecedário, não constrói frases, não sabe ler nem escrever!!!Hoje passados estes 4 anos eu tenho a consciência que se não tivesse ajudado o meu filho em casa, ele não sabia nem o que era o numero 1 , nem a letra A, quanto mais saber a matéria que um aluno de 4ª classe.E como estes factos são uma dura realidade para mim, entendi que se o Gonçalo não tem capacidade de aprender a ler e a escrever ao menos que consiga aprender uma profissão, ou a fazer algo que o ajude numa vida futura.
E foi com base nestes factos que fui mais uma vez a luta e procurei dentro do distrito de Setúbal, uma escola de educação Especial onde pudesse colocar o Gonçalo, onde ele pudesse realmente aprender dentro dos métodos de ensino próprios para ele, e em que ele se sentisse bem aceite, sim porque tenho consciência que nesta altura o meu filho já se sente muitas vezes rejeitado/ descriminado pelos colegas devido a deficiência que tem.Após vários meses de pesquisa e vários dias de telefonemas e consultas, encontrei a escola que pensei ser a ideal para ele – o Extrenato Rumo ao Sucesso.
Marquei uma entrevista nesta Escola, com a Psicóloga da mesma e fui lindamente atendida, as pessoas mostraram-se disponibilizadas para receber o Gonçalo e eu pensei finalmente tenho o meu filho bem encaminhado. No entanto ao contactar a escola oficial, deparei-me com MAIS um problema, é que para o Gonçalo poder ir para esta escola e dado que embora seja de um particular esta ligada ao Estado, eu tinha que pedir à Escola da Azeda o encaminhamento do Gonçalo para o Extrenato Rumo ao Sucesso ao Ministério da Educação.
Falei com a Professora de Apoio Educativo da APPACDM, a qual se ofereceu de imediato para tratar do processo e assim foi.Hoje e, passados um Mês, recebo a noticia de que o Gonçalo , não pode transitar para a Escola de Educação Especial – Extrenato Rumo ao Sucesso, porque saiu uma nova Lei, que diz que, por despacho do Senhor Secretário de Estado das Educação, apenas são elegíveis para Encaminhamento " os alunos que, com base na avaliação realizada por referência à Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF, OMS ) revelem dificuldade completa simultaneamente nos domínios da mobilidade o dos auto - cuidados, decorrentes de deficiências ao nível das funções e/ou das estruturas do corpo, e que, necessitem de cuidados diários de reabilitação não passíveis de ser prestados na escola Regular". No caso do Gonçalo considerou o Ministério que se trata de um jovem com 12 anos, com deficite intelectual moderado/grave e hiperactividade com deficite de atenção, que manifesta dificuldades de aprendizagem e comportamento imaturo.
No entanto consideram que as dificuldades escolares apresentadas pelo Gonçalo, continuam a poder encontrar resposta satisfatória no contexto de um ensino regular, pelo que não se justifica o seu encaminhamento.Agora pergunto eu, como é que o meu filho , que é uma criança, que não se consegue orientar sozinha, que não sabe expressar-se correctamente, dado que tem graves problemas a nível da linguagem, que não sabe ler uma frase completa, que não sabe fazer contas e conhece os números até 10, que não sabe escrever sequer, que necessita de acompanhamento diário porque não nem a sua higiene sabe fazer sozinho, vai fazer para uma escola do 2ª ciclo, em que vai ter que se deslocar dentro de varias salas de aula, com vários professores, porque vai ter varias disciplinas, para falar de assuntos que ele nem sabe o que são?O ministério fala-me que disponibiliza apoios escolares, ou alguém que o acompanhe, quando durante estes 4 anos e numa escola primária, o meu filho NUNCA os teve e deveria de os ter tido.
Mais uma vez pergunto, como vai ser a vida desta criança daqui para a frente?Até hoje sempre tentei dar ao Gonçalo uma vida normal e há cerca de 5 anos atrás, após percorrer todas as escolas/ ATL de Setúbal, para lhe arranjar um local onde podesse permanecer depois do período das aulas e até eu chegar do meu trabalho, todas as portas me foram fechadas, a excepção de um ATL – São Cristóvão, dado que é particular e para o qual pago mensalmente 312€/Mês para que o Gonçalo durante 4 horas possa conviver com outras crianças até eu chegar a casa. Mas também este esta a acabar derivada a idade do Gonçalo. Assim sendo e se o Gonçalo tiver mesmo que continuar no ensino regular, no próximo ano como é proposto pelo Ministério da Educação, eu vou deparar-me com mais este problema uma vez que já não terei este ATL, para o poder ter no período da tarde.Pergunto o que vou fazer com esta criança que poderia ter acesso a aprender mais alguma coisa e quem sabe uma profissão e o Ministério da Educação lhe corta as pernas?Será que o que me resta vai ser ter que deixar de trabalhar e viver com uma miséria de pensão que o estado lhe paga de 155€ / Mês, para poder ficar com ele em casa?Será que não existe ninguém neste pais que veja que estas crianças também tem o direito a ter uma vida minimamente digna?Será que neste pais só é importante gastar-se milhões em Estádios de Futebol que não servem para nada? Ou criar-se centros para os toxicodependentes poderem tomar metadona que até nem é paga, enquanto que todos os medicamentos que eu tenho que pagar por mês para o meu filho tomar diariamente, não tem nem 1 cêntimo de comparticipação?Cada dia que passa tenho mais tristeza de viver no pais em que vivo e de tudo aquilo com que me deparo. Às vezes penso até quando vou ter forças para lutar?Obrigado por lerem este meu desabafo.Sinto-me desesperada sem saber o que fazer.

Cumprimentos,Alexandra Trinca

5 comentários:

MamãdaDiana disse...

Realmente...

Sandra disse...

Os "Senhores Legisladores" deste país só vêm o que lhes convém...

infelizmente.

Portugal está a tornar-se um país vergonhoso...

Não favorece quem realmente necessita...

liliana disse...

Infelizmente e o país que temos, e cabe a cada um de nos todos os dias contribuir para que se torne melhor...

Anocas disse...

Dizemos sempre "é o país que temos", indignamo-nos com os legisladores, reclamamos nos "livros amarelos", e a nossa vida vai seguindo em frente, às vezes sem nos dar-mos conta de que a dos outros parou e... não anda!
A minha solidariedade com esta senhora é imensa, mas... não chega!
Infelizmente sei-o por experiência própria.
Enquanto não houver uma verdadeira "revolução" que defina aquilo que é realmente importante neste país, então nada feito!
É que a verdade é que todos têm pena e compreendem a situação, mas não a vivem, não sabem qual é a dor de ver um filho não evoluir, não CRESCER por falta de apoios, no fundo não ter dinheiro para ajudar aquilo que mais amamos na vida: A nossa Criança!
Os apoios têm aumentado muito dizem eles... pois é, só se fôr para quem não trabalha, não estuda, não se esforça e não quer.
Neste país os premiados são: os que se encostam e/ou dedicam à marginalidade e a não lutar pela vida!!

Anónimo disse...

Comoveu-me imenso este relato da mãe do Gonçalo, não só porque conheço esta realidade por dentro - no que me diz respeito, também já passei pela dita «ajuda oficial», ou o tal direito ao «apoio específico» que mais não era do que a própria professora das actividades lectivas passar mais uma hora com as crianças que estavam abrangidas pelo decreto, chegando rapidamente á conclusão que esse apoio não se traduzia em nada concreto...- mas também porque ao retirarem os meninos com distúrbios de comportamento como a hiperactividade, desse tal decreto que permitia por ex. um número reduzido de alunos na sala e direito a apoio psicológico, vou ter no próximo ano lectivo uma luta ainda maior em relação á qualidade do ensino que o meu filho terá. Senti-me ainda muito mais próxima desta mãe por reconhecer que o meu caso não é nada comparado com o do Gonçalo e de outros meninos como ele ou como o D... filho da minha grande amiga N... que se viu confrontada com a caricata situação de ver o estado atestar uma capacidade de apenas 25% de autonomia ao menino mas ao mesmo tempo recomendar a sua integração no ensino regular atribuíndo a esta criança portadora de X Frágil ( com autismo associado e muitos problemas motores) a ridícula presença de uma professora 2 horas por semana(!)e a ajuda de uma auxiliar que mais não faz do que o levar á casa de banho quando pressente que ele necessita(!!)
É bom que estas mães lutem pelos filhos mas era muito melhor se essa luta não fosse apenas delas, fosse uma luta de consciência social, o reconhecer da igualdade que tantas vezes fica só no papel...
A todas um bem haja e muita força á bonita mãe do pequeno/grande Gonçalo!
A ti Filipa um beijinho grande